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STJ mantém no ar site de empresa de Curitiba que vende petições feitas por IA

Ministro Herman Benjamin não só manteve o site da empresa no ar como chegou a tecer elogios na decisão judicial.

O ministro Herman Benjamin, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou o pedido da OAB do Rio de Janeiro para suspender as atividades de uma empresa da cidade de Curitiba que faz a venda online de petições feitas por inteligência artificial (IA).

As “peças jurídicas” são elaboradas de forma automatizada a partir de um formulário preenchido pelo interessado — bastando clicar em “gerar petição” e receber o documento em instantes. O custo é de R$ 19,90.

A OAB carioca ingressou com a ação no STJ por repudiar a comercialização de petições elaboradas com uso de IA e vendidas na rede social — o que, no entendimento da entidade representativa, desrespeita a advocacia e configura exercício ilegal da profissão.

Para a OAB, o funcionamento do serviço representa exercício ilegal da advocacia, bem como grave ameaça à ordem pública e à cidadania.

No entanto, o ministro Herman Benjamin não só manteve o site da empresa no ar como chegou a tecer elogios na decisão judicial. O presidente do STJ destacou que a plataforma apenas visa auxiliar a elaboração de petições iniciais com o uso de inteligência artificial para ações de pequenas causas, que não exigem advogado.

“Isso favorece a ampliação e a democratização do acesso à Justiça, permitindo ao cidadão com menor grau de instrução submeter ao Judiciário sua pretensão nas causas de valor limitado ao teto legal, com a cobrança de valores módicos pela prestação de tal serviço, que não tem qualquer correlação com honorários de advogado”, pontuou.

O presidente do STJ destacou ainda que a lei prevê a dispensa a assistência obrigatória de advogado nos juizados especiais nas causas de valor até 20 salários mínimos. “Ora, em tese, seria paradoxal dispensar por lei a assistência obrigatória de advogado e, ao mesmo tempo, entender que o cidadão só poderia receber auxílio, inclusive na formalização de seu pedido, por meio de advogado. E ainda pior seria vedar, pela via transversa, o uso de ferramentas amplamente utilizadas atualmente até por pessoas leigas, como a inteligência artificial”, argumentou.

Judiciário se depara com o uso de IA

O caso chegou ao STJ depois que o desembargador federal Marcelo Pereira da Silva, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, revogou a decisão da 27ª Vara Federal do Rio de Janeiro que suspendia as atividades da empresa.

O Judiciário brasileiro tem se deparado com episódios recentes de uso de inteligência artificial. Um dos casos chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) e o ministro Cristiano Zanin rejeitou reclamação constitucional redigida por uma ferramenta de IA.

“O advogado parece ter usado inteligência artificial sem revisar depois e tentou enganar o STF com precedentes falsos e interpretações erradas”, disse Zanin. Além de rejeitar a petição, o ministro multou o autor por má-fé e ordenou que o caso fosse levado à OAB para a adoção de providências.

O Blog Politicamente mostrou que um caso semelhante no Tribunal de Justiça do Paraná — durante o julgamento de um recurso na 1ª Câmara Criminal envolvendo um homem acusado de homicídio em Ponta Grossa em 2021. O desembargador relator, Gamaliel Seme Scaff, identificou que o advogado dativo (nomeado pelo juiz) teria usado inteligência artificial no recurso apresentado ao colegiado do tribunal paranaense.

O magistrado pontuou que o recurso criou 43 jurisprudências que não existem, além de inventar nomes de desembargadores do TJ do Paraná, citar a decisão de um magistrado numa data em que ele já estava aposentado e ainda confundir um julgador do TRF4 como sendo do tribunal paranaense — questões elementares para os operadores do Direito.

A empresa, com sede na cidade de Curitiba, nega que a venda dos documentos configure mercantilização da advocacia. E cita que só fornece documentos para causas de até 20 salários mínimos, porque esse é o limite previsto em lei para que uma pessoa acione os Juizados Especiais sem assistência de advogado.

Afirma ainda que as atividades estão amparadas pela lei — já que é permitido que qualquer cidadão possa elaborar sua petição inicial sem a necessidade de um advogado. E que a plataforma se limita a prestar um serviço de suporte na criação de documentos, garantindo que as pessoas possam reivindicar seus direitos de forma acessível e rápida.

 

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