Enquanto deputados de oposição e governistas da Assembleia Legislativa discursavam sobre o uso do software israelense pela Polícia Civil do Paraná e também sobre a inusitada presença do marroquino Mehid Mouazen na Divisão de Inteligência e Informações Estratégicas da Controladoria Geral do Estado (CGE), a mais de 1.400 km daqui, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), dava uma canetada que pode clarear a questão da contratação da ferramenta de Israel.
Moraes determinou que a empresa israelense Cognyte informe a lista de todos os órgãos brasileiros que utilizaram a ferramenta “First Mile”. O objetivo do ministro é que a Polícia Federal investigue quem, além da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), operou o sistema secreto com capacidade de monitorar, sem autorização judicial, os passos de até 10 mil pessoas por ano. A informação foi dada primeiramente pelo O Globo.
O Blog Politicamente mostrou que a Polícia Civil firmou um contrato com a Cognyte, em 2019. As informações sobre o uso deste software ainda não são precisas. Quando e quanto, por exemplo, foram pagos os R$ 6,2 milhões previstos em contrato pelo ex-secretário da Segurança Pública, Rômulo Marinho. Ele ocupa um cargo em comissão na Casa Civil e, até agora, não se manifestou.
Quem e como? — O Blog Politicamente apurou com fontes na capital federal que primeiro o ministro Alexandre de Moraes vai obter a listagem dos órgãos pelo país que contataram o software. Para em seguida, apurar, via PF, se o uso atendeu aos requisitos legais. Desde que o contrato veio à tona, o Governo do Estado diz que só forças de segurança usaram o programa israelense e sempre com autorização judicial. Foi justamente o uso descontrolado do software, por servidores da Abin, que embasou a ação dos federais.
A questão das informações sobre o uso deste software no Paraná é restrita ao governo do Estado. Portanto, somente uma auditagem no programa, solicitada por autoridades judiciais, vai responder aos questionamentos e suspeitas da oposição. O uso sem autorização judicial se transformaria num escândalo de grandes proporções e resultaria na demissão de servidores públicos — uma vez que a lei de interceptação é rigorosa com a prática deste crime. Imaginar então que um civil, marroquino, teria a senha de acesso deste software é bastante improvável.
Mouzen atua na CGE, em outro lugar, outro prédio, e possivelmente faz uso de ferramentas mais simples, porém com potencial de estrago. Agora dizer que houve uso ilegal, são outros quinhentos e precisa ser apurado. A oposição faz a parte dela, assim como os governistas. Requião Filho e Arilson Chiorato encabeçam as denúncias e Hussein Bakri e Gugu Bueno comandam a defesa do governo.
Na sessão desta segunda-feira, eles protagonizaram um cenário interessante. Enquanto os petistas sugeriram ouvir o marroquino Mouazen na Assembleia, para explicar seu trabalho e, principalmente, detalhar suas qualificações para a função de Diretor de Inteligência da CGE, Hussein respondeu a altura e disse que seria bom ouvir o policial civil Délcio Rasera, detido em 2006, no governo de Roberto Requião, e condenado a mais de 20 anos por interceptação ilegal.
Enquanto oposição e governistas se digladiam, a investigação do ministro Xandão caminha. E muito provavelmente, os Ministros Públicos Federal e Estadual do Paraná também abram procedimentos para apurar o caso. Por ora, o governador Ratinho Junior disse hoje que Mouazen segue na função na CGE porque “ele não fez nada de errado”.