Os reflexos da cassação de Deltan Dallagnol

O julgamento ontem no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que cassou o mandato do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos), surpreendeu até mesmo o mais otimista dos petistas. A maior aposta era que haveria um pedido de vista de um dos ministros que prorrogaria o resultado. Ninguém arriscava um desfecho.

E veio uma acachapante unanimidade, com os ministros acompanhando integralmente o voto do relator, Benedito Gonçalves, que entendeu que Deltan burlou a lei da Ficha Limpa ao pedir exoneração do cargo de procurador do Ministério Público Federal (MPF) para escapar da mais de uma dezena de processos administrativos que respondia internamente na instituição.

A alínea da Lei da Ficha Limpa que cassou o mandato de Deltan foi inserido pelo então deputado federal Flávio Dino, hoje ministro da Justiça no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. A intenção de Dino era proibir que juízes e membros do MP pedissem aposentadoria ou demissão para fugir das punições decorrentes de processos administrativos.

TRE-PR: quem entra? — A decisão do TSE tem efeito imediato, ou seja, Deltan já nesta quarta-feira (17) não é mais deputado federal. O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE) foi informado ontem mesmo da decisão colegiada. O tribunal paranaense fará hoje a retotalização dos votos para diplomar o substituto. E aí uma nova batalha judicial deve ser iniciada.

Uma fonte do TRE disse ao Blog Politicamente que ainda está incerto o nome do substituto. Pode ser o ex-secretário da Fazenda do Paraná, Luiz Carlos Hauly, que disputou a cadeira na Câmara Federal pelo Podemos e obteve quase 12 mil votos. Ou Itamar Paim, do PL, que fez 47 mil votos. Caberá aos juízes do TRE dar um ponto final nesta dúvida. A fonte alerta que possivelmente Podemos e PL devem judicializar a questão e o caso pode chegar ao TSE.

Reflexo em 2024 — O mais beneficiado com a decisão do TSE, sem dúvida, é Eduardo Pimentel (PSD) — vice-prefeito de Curitiba, secretário das Cidades do governo Ratinho Junior e candidatíssimo a prefeito na eleição de 2024. Deltan despontava como o principal adversário com chances de fazer frente à Eduardo Pimentel mesmo com o apoio do prefeito Rafael Greca e do governador Ratinho. Fora do jogo, Eduardo pode ter aí um caminho livre para conquistar a prefeitura.

O que a classe política já comentava, minutos depois da decisão do TSE, era sobre quem poderia herdar o espólio político de Deltan Dallagnol em Curitiba? Já tem muita gente de olho neste potencial de voto da República de Curitiba, do lavajatismo e no apoio do próprio Deltan e do senador Sergio Moro (União Brasil).

O próprio Eduardo Pimentel vai se arriscar por ali, atrás destes votos dos órfãos da Lava Jato. Deltan e Pimentel já conversaram sobre o cenário em 2024 e não seria surpresa uma aproximação. Mas isso atrapalharia os planos de Moro, caso ele queira chegar ao Palácio Iguaçu em 2026.

Ney Leprevost, que esta no União Brasil e pode disputar também a prefeitura de Curitiba, é outro que pode buscar em Moro este apoio do lavajatismo e tentar frear o ímpeto de Eduardo Pimentel. Mas antes teria que convencer o União Brasil e o próprio Moro — e para isso terá de ir com mais frequência para Brasília para contar com o comando nacional do partido. Ontem logo depois do julgamento, Ney fez um afago em Deltan e nos eleitores dele pelas redes sociais. Disse estar “solidário aos eleitores do Deltan que deviam estar sentindo uma enorme frustração”.

Invariavelmente Deltan vai consultar Moro antes de fazer qualquer aceno de apoio político a quem quer que seja.

E na Esquerda… — Quem também pode sair beneficiado é o ex-prefeito de Curitiba Luciano Ducci (PSB), que ontem esteve em Brasília com o vice-presidente Geraldo Alckmin para dizer que é pré-candidato na eleição de 2024. Comenta-se nos bastidores que ele poderia ser o cabeça da chapa que aglutinaria as siglas da esquerda e, de lambuja, ainda traria o PSDB do antigo aliado Beto Richa — que tá mais vermelho que azul.

Petistas desenhavam dois cenários — com e sem Deltan. Na primeira hipótese acreditavam que era necessária uma candidatura petista para rebater os ataques que Deltan faria ao presidente Lula. Mas com o novo quadro, o PT pode emplacar um vice para Ducci e comandar uma grande parte da administração municipal — num eventual governo do PSB. A intenção, seria aos poucos, “entrar”em Curitiba e ir ganhando a simpatia do eleitor curitibano. Para isso, contaria com a injeção de recursos do Governo Lula em programas populares.

Recado ao Lavajatismo — Nos bastidores, o julgamento do TSE pode ser entendido também como um sinal alto e explícito ao lavajatismo e, principalmente, a Moro, da resistência nos tribunais superiores. A missão na capital federal seria extinguir a Lava Jato da política?

Sergio Moro ainda tem pendente julgamento aqui no TRE do Paraná, que independentemente do resultado vai desafogar lá no TSE, e outro com a ministra Carmen Lúcia no STF que pode resultar também em cassação de mandato.

Fato é, que o TSE “alijou” os dois mais recentes fenômenos nas urnas do Paraná: primeiro foi Fernando Francischini, cassado por divulgar notícias falsas contra o sistema eletrônico de votação, que teve mais de 427 mil votos em 2018 para deputado estadual; e agora Deltan Dallagnol com os seus 345 mil votos. Estamos falando de cerca de 800 mil eleitores que ficaram “órfãos”dos seus representantes.

Se Moro tiver o mesmo infeliz destino, o Paraná vai pedir música no Fantástico. Ou no TSE, que vai criando uma jurisprudência paranaense em casos de cassação de mandato — medida, que outrora, já foi vista como um atentado à soberania das urnas.

 

Foto: Rodolfo Buhrer / La Imagem

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