Por uma diferença de apenas quatro votos, os desembargadores do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Paraná negaram nesta segunda-feira (19) o habeas corpus do deputado estadual Ricardo Arruda (PL) que buscava anular a investigação do Ministério Público do Paraná que culminou com a denúncia pelos crimes de lavagem de dinheiro e concussão — numa nova modalidade de “rachadinha” — e ainda o pedido de afastamento do parlamentar.
Vencida a etapa do julgamento do habeas corpus no TJ, o desembargador Jorge Vargas, relator do caso, vai agora apreciar o recebimento da denúncia e também o pedido de afastamento de Arruda do mandato parlamentar. Não há prazo para o julgamento sobre a denúncia contra Ricardo Arruda.
Caso seja aceita, será a segunda ação criminal contra o deputado — que já responde pelos crimes de associação criminosa, desvio de dinheiro público e tráfico de influência em outra denúncia do MP. Aliás, por conta deste processo criminal, Arruda deve sofrer mais um pedido de afastamento — só que agora da cadeira da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
Em entrevista à jornalista Rafaela Moron, no programa Ric Notícias Opinião desta segunda-feira, o presidente da OAB do Paraná, Luiz Fernando Pereira, adiantou que a entidade iria encaminhar um ofício à Assembleia Legislativa solicitando o afastamento do parlamentar.
Durante o julgamento desta segunda-feira, no Órgão Especial, a defesa de Arruda sustentava que o MP não tinha autorização do Órgão Especial do TJ para investigar e denunciar o parlamentar, mas prevaleceu o entendimento do relator Jorge Vargas de que os atos foram convalidados pelo ex-corregedor-geral do TJ, desembargador Hamilton Mussi, que faleceu no ano passado. A divergência, aberta pelo desembargador Miguel Kffouri Neto, acabou vencida pelo placar de 14 a 10.
Após a proclamação do resultado, feito pela presidente Lídia Maejima, o desembargador Octávio Campos Fischer ressaltou que o julgamento do HC de Ricardo Arruda ia contra a jurisprudência do Órgão Especial ao manter a investigação contra o deputado — preocupação externada também pelo magistrado Luciano Carrasco Falavinha Souza, que chegou a comentar “um caso idêntico”, citando o trancamento de uma investigação contra o deputado Soldado Adriano (PP).
Relatórios do Coaf deram o pontapé inicial
Considerada legal pela maioria do Órgão Especial, a denúncia contra Ricardo Arruda teve como ponto de partida relatórios do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) que identificaram, entre os anos de 2014 e 2019, uma série de atividades financeiras atípicas envolvendo servidores comissionados e pessoas do círculo pessoal do deputado do PL, que geraram suspeita da prática de crimes contra a administração pública e de lavagem de dinheiro, o que ensejou a comunicação ao MP.
Ao longo de 118 páginas, o MP narra uma nova modalidade de rachadinha — com um ou outro registro de saques e depósitos entre contas bancárias, que deixam rastros, tão comuns em investigações desta modalidade criminosa. Mas a “inovação” era, segundo denúncia do MP, na habilitação de vias adicionais dos cartões de crédito de assessores em nome de Ricardo Arruda e também da esposa do parlamentar, Patrícia Arruda Nunes.
Na prática, o cartão estava no nome de um assessor parlamentar, mas quem de fato usava, ainda de acordo com o MP, era o deputado e a esposa em benefício próprio. Os gastos são das mais diferentes naturezaas, mas pagos, rateados, pelos funcionários lotados no gabinete parlamentar ou em comissões ligadas ao deputado bolsonarista. Através destes cartões, eram adquiridos bens e serviços que beneficiavam a família Arruda. Os gastos nos cartões somam quase R$ 250 mil.
Outra vertente utilizada, foi o pagamento de dívidas contraídas por Ricardo Arruda através dos cartões bancários. O MP chega a citar uma amortização de R$ 184 mil do financiamento habitacional do deputado. Tudo, segundo a denúncia, custeado pelos assessores. Assim como o pagamento de parte de uma caminhonete.
Viagens de luxo, nacionais e internacionais, refeições em restaurantes de luxo, compra de televisão — até pagamento de plano de saúde da sogra do deputado, veja só, foram pagos com o cartão de crédito de servidores ligados ao bolsonarista. Nem o sorvete de R$ 15,50 no Cold Stone e uma corrida de R$ 7,00 do Uber escaparam do uso cartão do assessor. Aplicativo de música Spotify também foi pago com o cartão de assessores.
Todo o esquema de desvio de dinheiro foi esmerilhado por um ex-chefe de gabinete de Arruda numa delação premiada já homologada pelo Tribunal de Justiça. A denúncia é extensa e pormenoriza cada um dos gastos. Com a palavra agora, o desembargador Jorge Vargas, relator do caso, que vai decidir se aceita ou não a denúncia contra Ricardo Arruda e também o pedido de afastamento do deputado do mandato na Assembleia Legislativa do Paraná — já que o MP diz, na época da protocolização da ação, ter provas de que a prática criminosa não foi interrompida
Operação do Gaeco — Arruda chegou a ser alvo de uma operação do Gaeco em outubro de 2023 quando foram cumpridos seis mandados de busca e apreensão expedidos pelo Órgão Especial do TJ. Policiais do Gaeco estiveram no gabinete de Arruda na Assembleia e na casa do parlamentar — além de endereços ligados a alguns assessores.
Outro lado — O advogado Jeffrey Chiquini, que representa Ricardo Arruda, considerou acertada a decisão do Órgão Especial.
Nosso habeas corpus pleiteava o trancamento da investigação, e, como a denúncia já foi oferecida, o HC perdeu seu objeto. Contudo, foi unânime na Corte que a tese da defesa está correta, no sentido de que a investigação foi ilegal, pois iniciada sem autorização do TJPR, não respeitando, assim, o precedente da Suprema Corte. O ponto de discordância dos eminentes desembargadores foi sobre o momento de análise e reconhecimento da tese, prevalecendo o voto do relator, que entendeu que a questão processual deverá ser analisada na sessão marcada para o julgamento de recebimento da denúncia. Nós, da defesa, entendemos como correta a decisão da corte e acreditamos que a denúncia será rejeitada, eis que eivada de vício insanável.