O Governo do Paraná correu para suspender um contrato de pouco mais de R$ 1 milhão firmado pela Secretaria da Segurança Pública com um supermercado para o fornecimento de alimentos para atender a demanda do 18º Batalhão da Polícia Militar, na cidade de Cornélio Procópio. A pressa governamental tem motivo.
O contrato foi alvo de uma denúncia feita pelo vereador de Curitiba, Da Costa do Perdeu Piá (União Brasil) pelas redes sociais. O parlamentar acusa a Sesp de contratar sem licitação um supermercado da mulher de um capitão da Polícia Militar. E pior. O contrato não estaria sendo cumprido já que, segundo o vereador, os poucos alimentos entregues estavam vencidos.
O Blog Politicamente teve acesso ao contrato e ao aditivo. A contratação foi feita de forma emergencial no dia 6 de novembro de 2024 com um supermercado na cidade de Santa Mariana — que fica a menos de 20 km de Cornélio Procópio, onde está o 18º Batalhão da PM. O supermercado receberia R$ 339.124,44 pelo período de quatro meses para fornecimento de alimentos — que vão desde carne, frango, 6 toneladas de arroz, 1200 garrafas de óleo de soja, 800 kgs de queijo, 1 tonelada e meia de açúcar e outros 200 kgs de sal, dentre outros.
Em fevereiro de 2025, veio a assinatura de um aditivo contratual — acrescendo mais R$ 678.428,88 e ampliando em mais oito meses o prazo contratual, totalizando um período total de um ano pelo preço de R$ 1.017.553,32, sem a realização de licitação. Os contratos são assinados pelo secretário da Segurança, Hudson Teixeira.
O vereador Da Costa do Perdeu Piá no vídeo feito nas redes sociais elenca uma série de “coincidências” que envolve esta contratação emergencial. O parlamentar pontua que o capitão da PM tinha acabado de sair de férias, mas retornou dia 4 de novembro, quando ainda faltavam 24 dias para o término do seu período de descanso.
“Por coincidência, assumiu a função de chefe da P4, que é, segundo o denunciante, o setor responsável justamente pela fiscalização de compras do batalhão. E por coincidência, dois dias após o seu retorno, foi fechado o contrato com o supermercado, cuja dona é, por coincidência, esposa do capitão. E por coincidência, dois meses depois do contrato, o casal comprou um carro zero quilômetro”.
A situação se agrava quando o vereador cita que os policiais militares estão cotizando para fazer as compras do batalhão — e mostra um print de um grupo de whatsapp. “O mais revoltante é que mesmo com todo esse investimento milionário, os policiais estão comprando comida com dinheiro do próprio bolso para se alimentarem durante suas duras jornadas de trabalho”, diz no vídeo.
Por fim, Da Costa do Perdeu Piá afirma que todos as provas mostradas no vídeo já foram encaminhadas ao Ministério Público do Paraná para averiguação. O Governo do Estado, no entanto, se antecipou e determinou a suspensão do “curioso” contrato. Na postagem, o vereador diz acreditar que o governador Ratinho Junior não saiba o que está acontecendo no 18º Batalhão da PM.
Sesp se manifesta e secretário manda indireta
Por meio de uma nota oficial, a Secretaria da Segurança Pública e a Polícia Militar informaram que contrato já foi suspenso e que foram abertas sindicâncias para apurar a compra de alimentos pelo referido batalhão. E ainda que “a Controladoria-Geral do Estado vai ajudar na condução dos processos, que envolverão a reunião dos documentos e consulta aos servidores envolvidos”.
Pontua ainda que a dispensa de licitação foi autorizada de maneira emergencial porque ainda está em andamento a contratação de uma empresa para fornecer alimentos a todas as unidades do 2° Comando Regional da Polícia Militar, do qual o 18º Batalhão da Polícia Militar está subordinado. E ainda que “o processo de dispensa contou com mapeamento de preços e consulta a mais de um orçamento”. A Sesp finaliza a nota afirma que “não compactua com irregularidades e as sindicâncias reforçam o compromisso com a transparência e a correta e justa aplicação dos recursos públicos”.
O secretário Hudson Teixeira está nos Estados Unidos acompanhando as agendas do governador Ratinho Junior. Numa rede social, ele postou sem nominar ninguém: “Começou o jogo sujo. Continuo trabalhando é o que sei fazer. Quem me conhece sabe que sou. Sou forte, aguento a porrada”. É preciso pontuar que Hudson Teixeira tem aspiração política e pode concorrer a uma das 54 cadeiras de deputado estadual na eleição de 26.
Vereador era soldado da PM

O vereador Da Costa do Perdeu Piá era das fileiras da centenária Polícia Militar do Paraná. Ele era soldado quando pediu o desligamento da corporação após uma suposta perseguição. Da Costa ficou famoso nas redes sociais quando, num canal do Youtube, começou a postar vídeos com ações que ele realizava no cumprimento do serviço militar.
Um dos vídeos que mais audiência foi uma resposta de Da Costa à uma entrevista ao deputado Guto Silva, que na época era chefe da Casa Civil do governo Ratinho Junior, em que ele comentava que os policiais militares estavam motivados com a escala extra jornada. O então soldado respondeu no canal do Youtube propondo um desafio: “a cada um policial satisfeito que aparecer, eu apresento 100 que estão insatisfeitos”.
“Cansei de ver irmão de farda colocando uma pistola na cabeça e tirar a própria vida. E aí surge um deputado e fala que toda a tropa está satisfeita. Eu não aguentei. Tive que falar”.
A declaração pegou muito mal e a polícia abriu um IPM (Inquérito Policial Militar) para apurar a infração ao artigo 166 do Código Penal Militar (CPM) que “proíbe a publicação ou crítica indevida por militares”. A pena prevista é de detenção de dois meses a um ano, caso o ato não configure crime mais grave. Com receio de ser expulso das fileiras da PM e, assim, ficar inelegível, Da Costa preferiu interromper a carreira militar.
“Eu fui obrigado a abrir mão de um sonho de infância”, relatou o agora vereador num vídeo publicado em setembro de 2024.