A figura para lá de sui generis do marroquino Mehdi Mouazen sempre chamou a atenção dos palacianos. Sotaque árabe carregado, muito cordial, educado e prestativo, a história de vida, narrada sempre em tom baixo, despertava a curiosidade dos ouvintes. Afinal, Mouazen se dizia membro da família real marroquina, mas que vivia sob ameaça. Com 30 anos, tem o perfil clássico do leonino: vaidoso, nem tanto extrovertido, e muito carismático. Muito mesmo.
Desde 2014 no Brasil, quando rompeu a fronteira de Foz do Iguaçu para começar a vida no Brasil, Mouazen conquistou o título de refugiado dois anos depois com a supervisão de um membro da igreja de Brasília que hoje veste capa preta. O marroquino acabou importado para a capital paranaense pelas mãos abençoadas de um pastor que até pouco tempo atrás tinha cargo de destaque no Palácio Iguaçu. A amizade esfriou e os dois se afastaram depois que o pastor deixou de dar expediente no Palácio Iguaçu.
Mouazen ascendeu na carreira dentro do governo e vieram novos amigos e até hermanos. Comenta-se que ninguém entendia nada quando se misturava o árabe com o castelhano num dialeto que só os interlocutores compreendiam. A comunicação, ao mesmo tempo os aproximava e distanciava.
Se antes era uma iminência parda, discreta, Mouazen ganha agora os holofotes e as luzes devem se intensificar. Na verdade, desde que ele assumiu a Diretoria de Inteligência e Informações Estratégicas da Controladoria Geral do Estado (CGE) — embora ultimamente seja mais visto no espelhado e bem guardado Edifício Baracat, a poucos metros da sede do Ministério Público Federal, no Centro de Curitiba. Câmeras de segurança vigiam dia e noite as três entradas de garagem que dão acesso ao prédio. Não há portaria. Mas conta com arame farpado no topo da marquise para evitar invasões — tão comuns na região central. No vai e vem frenético da Marechal, uma boa padoca, quase defronte ao prédio, é ambiente ideal por aqueles que não dispensam um cafezinho quente e um bom donuts.
Mouazen deve voltar à pauta da Assembleia Legislativa na próxima semana — é a promessa de parlamentares oposicionistas. Talvez único tema que não provoque arroubos entre os antagonistas Ricardo Arruda e Renato Freitas. Governistas devem apenas ouvir os deputados da minoria. Mas se aqui eles são oposição, em Brasília são situação. E lá contam com o sempre midiático ministro Flávio Dino — que já recebeu mais de um pedido de informações sobre a operação Última Milha, dos federais, que possam corroborar seus discursos aqui. Dino, aliás, recebeu não só os questionamentos, mas até um ousado pedido de audiência na última quinta-feira. Não se sabe, ainda, se houve êxito.
Reunião noturna — Enquanto isso, por aqui, instalou-se um verdadeiro mal estar “real”, da realeza marroquina, no Palácio Iguaçu. Integrantes do 3° e 4° andares, a até membros da Agepar, vararam a noite de ontem tentando decidir o que e como fazer, mas, principalmente, a potencialidade de eventuais efeitos colaterais. Não há unanimidade. Todos são tidos como de confiança. Alguns defenderam colocar panos quentes e minimizam as falas dos deputados de oposição apostando no arrefecimento da mídia. Outros recomendaram a imediata exoneração.
De prático, o governo do Estado se manifestou hoje. O governador Ratinho Junior determinou a abertura de duas investigações — a primeira no âmbito da CGE, visando analisar a conduta dos servidores públicos, enquanto a outra vai tramitar na Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) para esclarecer os fatos. O Ministério Público do Paraná pode entrar também no caso na próxima semana — assim como os federais de Brasília que já rascunham relints com dados de fontes abertas e fechadas. Por enquanto, só e muita produção de conhecimento.
Raul Siqueira, cujo trabalho rendeu à CGE o selo Diamante ao Estado do Paraná, com índice de transparência que beira a perfeição dos 100%, pode emprestar a experiência e ajudar a colega Luciana Carla da Silva de Azevedo que hoje administra a Controladoria e tenta mapear o que acontece no trabalho dos subordinados.
Investigações — Da mesma forma, no âmbito policial, o ex-secretário de Segurança Rômulo Marinho Soares, que hoje é assessor da Casa Civil, pode ter importante valia na apuração comandada por Hudson Teixeira que não perdeu o faro policial nem o prestígio no Palácio — basta ver a recente decisão de mudar o Departamento Penitenciário do Estado, que provocou rusgas em alguns palacianos. Até mesmo o general do Exército Luiz Felipe Carbonell, que também comandou a Sesp e teve uma passagem por uma das diretorias da Itaipu, talvez possa auxiliar na hercúlea tarefa de cortar na carne. Toda a ajuda é bem vinda.
O Governo do Estado é taxativo ao bancar que a polêmica ferramenta de inteligência policial israelense foi usada somente com autorização judicial e exclusivamente pelas forças de segurança do Estado, mediante autorização do Poder Judiciário. É importante não misturar alhos com bugalhos. Diretoria de Inteligência da CGE e toda sua capacidade investigativa é uma coisa. O software da Polícia Civil é outra. Por ora, estão tratando tudo como uma coisa só. As investigações intramuros e extramuros vão separar o joio do trigo.
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